domingo, 16 de dezembro de 2012

Soneto do Derradeiro Prazer


Espalhar-me-ei no teu perdido vento
Que de sorriso tímido soa minguante
Deus, como me pesa o avarento
Por almejar deixa-lo vagando distante

Fia a lã do meu velho sentimento
Como se fosse altar do meu eu variante
Espio tua nudez comendo teu testamento
Pois sou louco por ti, e anseio ser teu amante.

Depois de espalhado, espero que seja claridade
Fim daquilo tudo que permanece ruim
Ora, se um dia alcançar aquilo que ampara a humanidade

Que não seja morto em vão ou por mim
E viva a vida! voluptuosa na fraternidade
E nasçam vocês num deleite divino e fim.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Felicidade itinerante


Não existe essa coisa de uniforme.
Nada é uniforme
Nem mesmo nosso uniforme
Nada de contornos bem definidos
Como a visão de um míope, o mundo é turvo, dúbio.
Sentimentos híbridos, loucura e sanidade e, na sua intersecção, a humanidade.
Não há reparo para a alma mutilada
Vamos todos para o inferno, seremos felizes na viagem de ida.
Seremos felizes indo para qualquer lugar
Muito mais do que depois que chegarmos.
Pois não há objeto chamado felicidade
Há desejo
Nada definido. Embaçado. Uma curiosidade do homem.
Ando tão sem grana
Mas ando tão feliz.
Porque eu sou feliz andando.
Por imaginar que amanhã, no fim do mundo, eu me libertarei.
Set me free de você.
Sou feliz imaginando.
Sou depressivamente feliz, com pena de tudo, com impaciência social.
Sou feliz de fora pra dentro.
Eu não consigo ser só triste.
Nem só amante.
Nem só bandido.
Tenho que ser bom, namorado, feliz, desejado.
Não posso viver pra sempre de uniforme.
Para que todos me vejam, preciso viver nu.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Verbo 'ser' conjugado na infinita pessoa

O escuro me acolhe. O espaço reduzido me acomoda. A pouca roupa me conforta. Se a baixa temperatura estiver brincando na rua, ainda melhor.
Talvez eu tenha deixado minha vida na estrada. No caminho de ser alguma coisa. A falta de raízes não impede a existência de folhas secas voando, sem explicação alguma. Minha criação sem explicação alguma.
Sou eu, criado por mim. Meu Deus. Eu mesmo. O EU que eu trago aqui, em textos.
Ainda assim, eu necessito complemento. Como um verbo bobo. Uma piada com o português. Mas o vácuo é impreenchível e eu ecoo como uma sinfonia interminável. Para sempre, só eu.
E me possuo confiante: Intraduzível na língua humana e poliglota na língua artística.
Um menino brincando de herói. Abusando dos catalisadores poéticos, que, cá entre nós, você sabe quais são.
Vivendo num cativeiro de celas invisíveis, como todos os seres humanos no mundo de hoje. Com liberdade demais. Criando desenfreadamente. Fazendo arte.
Pff.
E riem de nós...
Como se o caos não fizesse nenhum sentido...
Querida, é o meu caos que vai me transmutar num anjo e congelar minha poesia no tempo e no espaço.
Logo, será eterna.
Sinto, logo, adoeço.
E morro. E crio. 
(Não necessariamente nessa ordem)
E vivo para sempre.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Braços

Ela era daquelas típicas meninas. Bela, gentil e sozinha.
Ela era sozinha com seu sentimento, saber aquilo tudo que ela faria por um par de braços para abraçá-la.
Mas às vezes o mundo simplesmente não gira.


A insatisfação é um sentimento macabro. Vive do lado da gente como um fantasma, um ente querido e morto que não se desapega.


Ela cresceu com aquele tesão pelo abismo. Porque se jogar era sua curiosidade diária, o combustível que a movia. Viver mais um dia para saber como seria o abismo um passo a frente. Porque tudo que é vivo morre. Ela morreria nos braços de alguém que a teria amado mais que a própria existência.


"Não há braços ao redor, exceto os meus próprios".
Ela só pode se segurar em si mesmo quando a vertigem a atinge. Não há braços mais fortes do que os seus.


Ela faz flexões.
Assim como todos eles.


Ela sente uma atração sem precedentes por um novo par de abrigos.
Não há lugar salvo o suficiente para suportar a tormenta do fim do mundo
Não há lugar protegido o suficiente para ser sua morada.


Não há sorriso, não há par de braços, não há carros, não há cores, não há amores...


"O amor vive em mim".
E viveu até o dia em que ela morreu.
O amor indestrutível de uma pessoa que se amou mais do que qualquer outra coisa no mundo e viveu por si apenas. Porque ninguém lhe era suficiente.
Uma história do silêncio levado às últimas consequências.

sábado, 21 de julho de 2012

silencio

Houve um Deus.
Houve uma fé, por anos, vivenciada religiosamente.



Só que, pelas circunstâncias sociais, minhas lembranças foram todas sufocadas. Algumas, por sorte, canalizadas numa só pessoa. Uma grande amiga.
Mas meus silêncios me matam tanto.
Eu sou uma criança egoísta. Que chora sozinha no quarto, quando ninguém vê. Eu sou meu próprio mártir. Só eu me vejo morrer. Escolhi ser sozinho e não sei lidar com isso.
Não sei reverter meu silêncio.
Como voltar a falar?

quinta-feira, 19 de julho de 2012

CAOS [6]

Vem voando
vem no vento
faz de mim
seu gato, seu negro, sua raiz, seus galhos.


dimensiona-me do tamanho do mundo.
Chore
me engrandeça

Eu sou teu veneno sexual, seu antídoto cristão, a anestesia artística de sua doença pagã.


Meu canto mudo foi escrito por entre as cobertas.
Você vem.
Volta.

domingo, 15 de julho de 2012

Hoje não é dia de muitas perguntas,

nem é hora ou lugar pra ficar se perguntando "por quê?". Porque as perguntas não respondidas machucam, frustram. O silêncio que se faz quando se grita desafiando tudo que é mais divino... Esse silêncio é mortal, dilacerador. Portanto, é melhor não perguntar nada.
Hoje é dia de um sentimento muito particular de impotência. De visualizar nossa diminuta existência no quadro imenso que é a vida e mergulhar de cabeça nessa revolta a tudo que não cabe na nossa compreensão.
Porque o que foge da nossa compreensão é facilmente odiado. Porque falta explicação plausível.
Mas hoje não é dia de procurar explicações.
A revolta que ameaça nos tomar é como uma brisa para o furacão. Não adianta de nada. E essa raiva desgastante, incômoda, que palpita no cérebro, é visível nas têmporas... Essa raiva destroi.
E hoje não é dia para se destruir. Porque muito já foi perdido.
Nas reviravoltas da condição humana, a natureza se contorce, torna tudo mais difícil, mais inatural. A vida que escapa das mãos, como água escorrendo por entre os dedos, e sublima aos céus. Desaparece.
Ah, Deus, que minhas palavras mesquinhas e egoístas cheguem inteiras aí, e que minha fé, inabalável como uma palafita num terremoto, não machuque ainda mais os corações que choram por não entenderem. Eu oro pedindo conforto pra quem precisa.
Porque não importa de onde nosso amor vem. Não importa o remetente divino ao qual dirigimos nossos pedidos e entregamos nossos entes. Nada disso importa, porque o que nos foi tirado é uma alma alimentada com tanto amor, tanto amor, que as fronteiras religiosas, híbridas celebrações dentro de cada um de nós, passam a ser tão pequenas...
Quem sou eu para falar sobre arte para um menino de 11 anos?
E ainda assim, houve um menino de 11 anos que parou para me ouvir falar.
Como família, somos todos um grande pilar, símbolo da humanidade que Cristo nos inspirou a praticar. A família não vai a lugar algum. Estaremos aqui. De longe e de perto, cuidando daqueles que mais precisam nesse momento.
Mesmo que jamais possamos entender.

A vida que se finda só não é maior do que o sentimento que permanece.
Seres muito amados são imortais.



Para meu querido primo, Rafa.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Minhas palavras e a humanidade

Um último suspiro e se finda a humanidade. Da forma que caminha, cambaleante, embriagada, errando o caminho com os passos que julga certo.
Minhas asas quebradas, queimadas, depenadas... Meus ossos expostos, ardendo sob o sol, desprotegido na neve, solitário. A humanidade morre a cada sorriso tristonho, a cada momento de solidão no caminho para o trabalho, a cada hora gasta trabalhando para poder sobreviver, a cada grosseria, a cada atropelamento, a cada falta de humildade...
Como seria bom se a humanidade morresse gozando numa orgia global.
Mas a humanidade morre vítima de si, na luta pela sobrevivência no jogo animal do dinheiro. Aprender a sobreviver no mundo dos homens, pós-moderno, multicolorido, despedaçado em ansiedade e depressão, é um aprendizado falso. O homem não nasceu para viver tamanha complexidade externa. Viver e crescer, internamente, já é difícil o suficiente. Não existe resposta que justifique milênios de atos humanos que nos trouxeram a essa dificuldade de viver.
Mas e o nosso corpo?
As cores pálidas das paredes, os atropelamentos, o cheiro de urina nas esquinas... O corpo que se desintegra debaixo do sol, evaporando ou explodindo, não é mais um corpo humano livre e coeso. É um corpo pobre, vítima de suas próprias malcriações. O corpo de uma criança má.
Eu aprendi a sobreviver em vários ambientes, a me adaptar com facilidade e a conviver com muitas pessoas. Hoje não sei exatamente a finalidade de tudo isso. Talvez seja uma piada irônica do universo querendo me fazer testemunha - não só vítima - da morte da humanidade em todo canto do globo.
Sinto que meu corpo se alonga no espaço enquanto seus membros se esfarelam no chão, uma poluição que passa despercebida no meio de tantos outros, padecendo de doenças do novo século. Com a cabeça doendo, o dente aberto, a língua bifurcada, o sopro cardíaco, a síndrome do pânico, a psicose, a eternidade no inferno. Que piada idiota! Cada desculpa que nos inventam, que a ciência cuida de teorizar e faz descer pela nossa garganta. Até nossos poemas são produtos dessa má digestão.
O homem, o lobo do homem.
A humanidade morre a cada música que não é escrita pelo amor.
Cadê meu horizonte de brinquedo, desenhado com giz de cera, que eu guardei com carinho na minha estante?
Os corpos vão se desintegrando no ar. Não paro pra localizar se há alguma esperança moribunda em mim. Eu sento e assisto, e vivencio.
Ah, humanidade...


Cadê minhas palavras?

terça-feira, 1 de maio de 2012

No escuro,


no dia do fim do mundo e na solidão depois da morte - somos todos iguais.
E não existe quem possa me consertar melhor do que eu mesmo.


Eu trago, tu traz
Atrás
de cada
um nosso
pesadelo
desejo
amanhã
é bom
dia


Eu serei no presente um presente pra quem vive comigo.
E quero desfrutar do meu riso no meu medo - que não é mais segredo - e poder despejar os baldes cheios de lágrimas que me seguravam no mesmo lugar.


Nós sabemos que sempre seremos aquilo que um dia já fomos, mas também seremos aquilo que nós deixamos de ser. Mas não vamos nos definir com uma palavra só. Somos múltiplos erros. Somos múltiplos acertos. Bonzinhos e mauzinhos. Cara e coroa.


Quando eu costumava te roubar de você, o amanhã era apenas um conceito incompreensível, mas, tudo que é vivo morre, tudo que é danado escapa. A felicidade é danada. O destino é danado. Cada escolha me fez escrever um pouquinho mais no caderno que levo comigo na mochila. EU NÃO ANDO SÓ.
Por mais que eu esteja sozinho escrevendo, não estou só.
Nascer e morrer são dois processos para os quais nunca estaremos prontos até chegar a hora. Não existem ensaios para nascer e morrer. A humanidade nasce e morre só. Mas ninguém disse que não poderíamos viver juntos nesse meio tempo passageiro que é a vida.
Por isso, com quem queremos estar amanhã?


Eu quero estar com quem é diferente de mim. E com quem é igualzinho a mim. Eu quero estar com alguém que possa saciar meu tesão por conhecimento, que me acrescente algo que preencha essas minhas lacunas imperfeitas da alma.


Quando eu costumava te roubar de você, eu me jogava tão sem medo que parecia uma criança. Eu sinto que quem me lê, de alguma forma, vê um reflexo de si. E não importa se já roubamos alguém ou se já fomos roubados de nós mesmos
Talvez, no final das contas, não sejamos assim tão diferentes.
A humanidade é composta por particularidades ironicamente desenhadas para se completarem.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

CAOS [5]

Dos desejos mais sombrios do homem...
Daqui eu falo.
Fale-me da violência dos atos. Respondo-te com a violência das palavras.


Incontrolável desejo psicopata suicida homicida divagante sujo apaziguador de coração
mente insaciável de vingança
vingança masturbável de cansar o braço




o segredo está na não-importância das coisas.
Assim, sobrevive-se com mais qualidade de vida.






Longevidade.
Quem não se importa vive mais e melhor.

E se eu pudesse entrar na sua vida...

Dias depois...
Meses depois...
Anos atrás...
Um último raio de sol visto no milênio passado. E eu nem sei mais por quanto tempo tenho andado sem rumo. Um objetivo confuso, vendo no horizonte apenas a silhueta de um futuro insatisfatório. Um mesmo sol brilhando na mesma janela ornamentada de flores mortas.
O mundo, enquadrado pelas plantas falecidas, entra pela minha janela há décadas.
As flores foram plantadas com tanto amor, cultivadas, nos seus poucos centímetros quadrados, com zelo para crescerem e abrigarem meu coração inquieto. Mas meu desejo vem de um lugar onde as medidas fogem dos padrões, ultrapassam limites quânticos e existem na plenitude e eternidade. Não consigo me conter em mim mesmo.
Talvez por isso, tudo que tenho se torna pouco.
E existe ainda a excitação das medidas exageradas. Como quando sentimos tesão pelas maiores altitudes e nos sentimos tentados a pular, mas o medo não nos deixa.
Talvez por isso, o pouco que tenho se torna suficiente.
O mundo, visto através dos meus olhos de hoje, se traduz como fotografias iguais, as mesmas poses e paisagens todos os dias.
Sabe, eu nem me daria conta, nem mesmo me incomodaria, se não fosse pelo seu repentino brilho de sol, novo e transbordante de vida, vindo de tão longe e me fazendo pensar que, talvez, sempre esteve por perto.
Enquanto alguma música depressiva toca como trilha sonora da minha vida editada, penso em como seria entrar na sua vida.
Eu faria todo um reboliço. Arrancaria do meu jeito esse teu sorriso inundado de sol de todos os dias. Presente divino, humano e vivo. Completaria da minha forma seus minutos, de forma com que eu me tornasse inesquecível e lhe apresentasse novas possibilidades de enriquecer o coração com prazer. Até arrisco dizer que seríamos poetas da improbabilidade, das variáveis engraçadas cujas respostas sempre estiveram na nossa cara, mas que, por algum motivo, permaneceram invisíveis por muito tempo.
Descobriríamos juntos tudo que se pode descobrir sobre o ser humano. E desvendaríamos a fórmula da juventude, que, ao contrário do que muitos pensam, ataca o sistema maléfico do corpo humano que nos envelhece por dentro, na alma. Dois velhinhos, duas crianças. A mesma coisa.
Com algum tempo, entenderíamos até o segredo da vida. Mas, é claro, como tudo que tenho descoberto recentemente, guardaríamos do mundo todas as respostas. E a fortuna se prolongaria no espaço, domaria o tempo, a vida infinitamente indo da carne ao pó – e vice-versa – com nossa essência para que, em todas as épocas, escrevessem os poetas e músicos sobre nossa estória.
Se eu pudesse entrar na sua vida, eu voltaria a plantar, mas não mais plantaria flores. Plantaria músicas. Longas sinfonias de metal pesado. Alguma balada morna e doce, rasgada, daquelas que transpassam a alma e explodem em algum lugar do nosso corpo errante. Coisas inexplicáveis.
Algo nos faria falar em línguas inexistentes. Uma forma de comunicação só nossa, que poderíamos usar em público e rir por ninguém estar entendendo.
Se eu conseguisse cruzar essa fronteira estúpida, ao menos por um minuto, eu poderia mostrar tanta coisa, tanta coisa... Mais do que minhas palavras, escritas ou faladas, poderiam descrever.
Mas... Me diz uma coisa.
Você está me entendendo?
Claro que muita coisa você sabe. Inclusive, deve saber melhor do que eu, um azarado assassino passivo-negligente das flores. Vejo tantos conceitos filosóficos abstratos que você desenha no seu diário todos os dias... Sei que bem sabes.
Ora, se algum dia eu, porventura, entrasse na sua vida...
Raio de sol.
Faria de tudo pra lhe mostrar a felicidade.

Ao meu lado.

segunda-feira, 5 de março de 2012

poemadavida

Oh céus,
Deus Dionísio Alguém Paraíso
Não alivie essa carga. Apenas aumente as forças.
Talvez seja esta a sina, a poética que surge do que se sente
Não com o cérebro, mas com a pele
Com a boca, a língua
o tato, o olfato
sente-se nos pelos, e arrepia.


A poética que surge da dor
Artistas, talvez vocês tenham mesmo que sofrer.
Para encontrar aquilo que nossos olhos não veem
E compor.


Cadê a vida nauseante que estava aqui? Está oculta, esperando para ser experimentada pelos sentidos.


Acredito que o propósito da vida não está no resultado final de uma explicação, portanto não será a ciência que abrirá finalmente nossos olhos. Se a vida escapa dos limites de qualquer explicação, é porque ela precisa ser SENTIDA, então, acredito que a arte, de alguma forma, compreenda melhor o segredo de todo nosso universo.


Mais palcos, mais galerias, mais telões, mais sinfonias.
Mais rimas, mais coreografias, mais monumentos, mais alegria.
Enfim,
mais vida!

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Metáforas [1]

O que resta de ti?


Que pena...

O que resta de ti é uma lona estirada sem qualquer zelo sobre duas vigas de madeira que sobreviveram a tempestade. Uma espécie de tentativa desesperada de ter onde morar com alguém, desejo sustentado apenas por você mesmo. O tipo de coisa que não vale a pena.

Você pode até acreditar que isso é uma casa e tentar se convencer disso, se ela lhe servir como uma casa no final das contas.


Mas isso não é um lar.
Não dá pra ser feliz aí debaixo.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

CAOS [4]

Um,
dois,
três,
quatro...
quatro batidas de um coração preso numa caixinha de preciosidades.
Tenho várias dessas relíquias.


Beleza.


Tenho a sensação de queda de novo.
E no meio, correm rios de vômito e gozo e orações e pecados e pênis e vagina e ânus e deformidades e simpatia e empatia e silêncios e secreções e vida e morte e morte e gelo e fogo e ar e gás e grito e alegria
Alegro-me de viver um pouco dentro de mim mesmo, porque fora não há nada.
Minha história existe em mim. Fora não há nada.
A existência não me transpassa. Ela acontece ao meu redor. Enquanto eu vivo pra dentro.


A minha diversão é só morrer quando eu quiser.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Dualidade I


Para Amanda Leal, querida amiga com quem trabalhava no momento em que esse texto nasceu.


Eu não sou só pó nem só o ópio. 
Não acredito que tenha nascido num momento de prazer e nem que tenha sido lindo meu nascimento. Acho que passei a existir muito mais do que a viver e assim foi por toda a minha vida. Sempre estive a dois passos da escuridão, mas não escuridão do mundo, nem da sociedade. A escuridão sempre esteve em mim mesmo!

Eu não sou má.
Eu sou má.

Para toda a ira, calmaria. Para toda a tristeza, júbilo. Para toda morte, um nascimento novo. Para todo homem, Deus. Para toda a escuridão... Luz? 
Onde?

Para todas as minhas desventuras, várias de mim nascem, frutos da minha imaginação que viaja no caos do chronos. 
Ah meu Deus,
O que teria sido de mim?

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

O silêncio dos culpados

Todo silêncio vem com um preço. E, geralmente, é caro.
Todo aquele silêncio que você olha e não compreende e julga e ri causa muito mais dano do que é visível.
Os silêncios que estou me acostumando a ver e dos quais me refiro aqui pesam tanto que, certa vez, fizeram uma pessoa enlouquecer a ponto de subir ao altar com um relacionamento que não se sustenta no amor.
Durante minha ignorância, eu fui, aos poucos, aprendendo a gostar de julgar o silêncio alheio, apontando o dedo para os muitos silêncios que via, como se quisesse torná-los vivos em palavra.
Hoje eu compreendo o valor da palavra não dita. Entendo seus motivos. Vejo o medo, vejo a vergonha, vejo toda a polidez, o social, o irreal, as sociedades falsas e, ao mesmo tempo, consistentes na sua realidade. E meu passado e meu presente param lado a lado e eu me comparo, como se visse duas fotos de personalidades diferentes, de maturidades distintas.
Sou daquele tipo de cara que dá a cara pra bater. Sou daquele tipo de ser humano orgulhoso, que não se rende fácil ao perdão, não importa de que lado da moeda esteja. Sou daquele tipo de anjo que de anjo não tem nada. Sempre fui um bicho livre.
Mas, o exílio em mim mesmo tem me mostrado tanta coisa que tem sido impossível me suportar. Minhas pontes, já velhas de tantas intempéries, caem como um castelo de cartas de baralho atacado por um furacão. Exilei-me em mim no meio de um tempestade brutal de sentimento e silêncio. Estou condenado a morrer quieto.
E por que morrerei precocemente de vazio?
Irrita-me o silêncios desses culpados pelas lágrimas dos outros. Meu Deus! Não cabe a mim gritar por ninguém. Mas eu quero tanto... Gritar por todos aqueles que já se casaram com o silêncio, dormem com a submissão todo dia. Quero expurgar todo o mal que o medo traz, fazer com que as palavras que o medo cala saiam voando pela sala, pela cozinha, explodam em coragem e assumam vida nova para seu dono.
O silêncio palpável me proporciona esse vazio. Esse eco de nada que se prolonga no vácuo. Nada. Recheado de nada. Coberto com nada. E, ao mesmo tempo, parece que é tudo que eu tenho. Como uma forte anestesia que não me prepara para cirurgia alguma.
E quando falo dos outros silêncios dos outros, acabo falando de mim mesmo. Das minhas palavras não ditas.
Preciso de ajuda nessa equação, preciso de algo que me forneça de novo um número não variável. Algo que seja de ontem, exista hoje e se prolongue no amanhã. Preciso de lembranças, vivas, não criadas, inventadas e reinventadas todos os dias.
Porque houve muito amor. Porque houve muita pressa e muita espera. Porque as chuvas teimaram em cair enquanto o sol rachava o solo infértil de nossos corações.
Eu vivi e criei e amadureci e trabalhei e me aposentei e morri na vida mediana. Engolindo os imperativos da existência de muitos. Sufocando em silêncios amargos, soluçando meus incômodos, fazendo justiça com o pensamento vingativo.

Tudo que permanece é um calor irritante. Sons ao fundo. O silêncio pesando como um defunto na sala, eu, num choro sem lágrimas, velando o meu próprio silêncio, e uma vida inteira que se perde no horizonte.

Para frente ou para trás?

...

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Meu coração...

Meu coração nunca permaneceu batendo tão distante de mim como agora. Dilatado do jeito que está, na certa, não sobreviverá amando, tampouco suportando a atmosfera desse lugar. O lar de outrora agora arde em fogo maldito.
Não reconheço sequer as esquinas das queimadas, ou as praças dos sorvetes. Parece que o asfalto clama por água, morto no verão de 2012, sufocado pelas pegadas pesadas de tanta hipocrisia.
Meu coração martela forte, na garganta. Minha pressão arterial está nas alturas, zombando de mim aqui embaixo, como se eu fosse apenas uma cobaia, sob teste perpétuo. Sobreviveria eu vendo tanta gente medíocre? Por quanto tempo?
E eu juro por tudo que há de mais sagrado que eu me esforço para compreender seus silêncios covardes, seus motivos egoístas, suas atitudes hipócritas, mas eu simplesmente não evoluo mais. Sim, sou eu! O problema é comigo! Eu não sigo adiante. Eu não me permito mais entender as pessoas.
Não entendo essas pessoas.
Não reconheço essas pessoas.
Não as tomo mais como irmãos, nem como amigos. Apenas as conheço, suas fisionomias. Mas as desconheço em caráter. Não compreendo.
Meu coração bate tão tímido perto dessa gente, como se bater empolgado demais pudesse me matar de vergonha. Nunca vi tantos sorrisos largos, forjando companheirismo, comprando os presentes mais caros. O cheiro no ar é doce. Então, ele fica azedo de repente. E aí, doce de novo. Como um botão de liga e desliga. Ligo e desligo meus olhos e meus olhos ligam e desligam cada um que passa por mim. Vejo um veterano de guerra adoecer de tristeza, de desgosto, de inveja de quem morreu em combate. Tenho tanta pena dos veteranos de guerra arrependidos, amargurados contra o próprio destino que os protegeu.
Meu coração quer dormir um sono de princesa presa na torre, porque isso significaria ainda ter esperança. Porque apareceria um coração de príncipe corajoso, honesto e bondoso para tirá-la dessa vida de ilusão. Meu coração bombeia álcool.
Hoje, meu coração acordou com uma vontade danada de se prostituir. De ser de todos, de se apaixonar cada vez mais pelos amigos, pelos colegas, pela família, pelas árvores, pelos caminhos, pelo sol e pela noite. Contudo, temo que ele terá que dormir sozinho mais uma vez. Não existem corações procurando amor fácil, aliás, não existem mais corações procurando amor at all. Existe traição.
Então, meu coração quer ser amante. E hoje a noite, sim, ele dormirá em paz.
Meus hábitos me engordam. Minhas noites vão produzindo um certo efeito de emburrecimento da alma. Empobrecimento da minha existência, pelo o que vejo e pelo o que ouço. Não é incomum ter um copo plástico ao lado de minha cama para as cusparadas que eu dou sempre quando me lembro desses corações que eu não compreendo mais.
Meu coração, hoje rico, vai comprar mais duas vidas para cuidar, assim como meus queridos amigos. Já que ele me abandonou, fugiu de mim, desempregado é que ele não fica. Vai trabalhar dobrado, ofertando gratuitamente suas maldosas opiniões e censurando aquilo que bem lhe convém.
Não sei bem por qual motivo, mas acho que meu coração não morrerá tão cedo.