quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Guerra Naval

Atrás de ti, vem ele
Mas antes só havias tu
Pois se vens só, que poderias dizer
Se no cais ainda o espero?

Há de haver dois ancoradouros
Para que atraquem-se
Que icem flâmulas para dizer
Que ambos reivindiquem seu próprio prazer.

Pois na marola escondida
um surripiou o outro
e agora ambos festejam
com o manjar ao deus do enrijecer.

Durmo com vós
Desatino de amar demais
Existo em cada canto, pronto para ser
Basta um dizer e vir a ser
Um único barco para todo o mar.

domingo, 22 de novembro de 2020

Caber

Disse:
— Não caibo mais.
Respondi:
— Não cabemos.
Não coube a mim chegar a uma conclusão.
Caberia, sim, se me fosse
Cabível de dizer que não sonhei.
— Fomos formas e fôrmas que já não cabem em si.
— Cabemo-nos?
— Quer tentar?

Tentamos em vão caber.
Forçamos tanta força que rompemos e não coube.
— Não sou forte: não caibo em mim. — Disse.
— E eu que não caibo no mundo? Que cabes a você dizer?
Caberá algo forçado que nos marque no fim?

Cabem 60 segundos num minuto e me forço a pensar.
Não há cabimento nisso que vou dizer.
Descabidos fomos e forçamos a querer
Espaço e distância para nos reaver
Couberam centenas de milhares de segundos
Nessa distância sem cabimento.
Caberá novamente eu em você?
Eu acho que sim.

terça-feira, 10 de novembro de 2020

O amor que foi

 soa poema como uma canção.
Perdi-me nos imbróglios meus
e não dei conta de me bancar.
A falta do amor que foi é presença
riscada na tinta da parede
no sol que brilha na lente
e faz ver tudo de repente opaco
o meu mais corajoso soneto
não dá conta de dizer do meu fracasso
porque ou estava longe demais
ou estava cego demais.
Qual castigo para fazer-se feliz?
Olhar para trás e se perdoar.
É uma dor que não machuca
é um sangrar que não convém
Não há males que vem pro bem.
Você faz deles o que bem entender.
O amor que foi é um parceiro de vida,
está em cada centímetro da memória
Mas não te fere para matar.
Só está em você agora.

Obstáculos

Na dianteira, a paixão de abre-alas avassala.
Como uma força da natureza, te impele.
Corrompe cada partícula do seu controle.
E te prostra diante do objeto.

O que você faz
se o objeto se apresenta destoante,
Cheio de obstáculos no caminho?
Se ao menos não entrasse no meio
Esse meu corpo e a maneira 
com a qual ao mundo me apresento...

Mas desejo é avalanche
terremoto maremoto erupção

e ciclone 
evento cataclísmico 
Os obstáculos são fichas
porque amor também é jogo.
Você pode arriscar e perder tudo na tempestade.
Ou pode ter tudo que sempre quis.

domingo, 2 de agosto de 2020

Círculos

Que vai você dizer de mim?
Quando perceber que eu ando em círculos
como um condenado por deuses
um Sísifo dos mares

Perseguindo a própria cauda
ora cheio de náusea
ora pleno de gozo

Quem disse que não poderia ser tão profundo assim
o amor que há em mim?
um pé preso no passado
na saudade que dorme do lado
de amores que nem mesmo terão fim

Quem poderia ter dito que seria tão dolorido
Viver sonhando com o desconhecido?
Querer saber o que virá além.
Não se vê o final da estrada rodando em círculos, porém
O futuro não será diferente se não foi resolvido.

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Um oceano

Que o escuro é meu lar
E o mar é meu forte
Isso eu já sei
Um nome de Marte
Que vem da guerra sem sorte
Espada de fogo apagada
É só uma espada.
Deixa que eu te durma
Envolto em lençóis de areia
E as pérolas raras em volta
O fundo imenso do vale
Vale mais do que toda a terra
Meu nome não é mais guerra.
Que o escuro é meu lar
E o mar é meu forte
Isso eu já sei.


terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Felizes para sempre

Eles viveram felizes para sempre.
É engraçado, porque essa medida é finita.
Uma vez que a eternidade não se mede.
É só uma metáfora romântica para tudo que morre.
O fato é que tudo se transforma.
A vida se transforma. A natureza muda.
Nada permanece sendo o que era no início.
O romantismo existe porque não conseguimos lidar com o fim.
Não conseguimos lidar com a morte das coisas.
O luto. A perda. O fim.
Tudo se transforma.

Eu já tive meu felizes para sempre.
Isso já está riscado da minha lista.
Agora, o ponteiro está apontando para outra direção.
Conseguir outras coisas que estavam no desejo.
Não há outra felicidade romântica por vir.
O felizes para sempre já aconteceu.
E, como é da natureza, acabou.
Agora, é o que vem depois.

Eu já fui feliz pra sempre. Dentro daquele momento.
Fui feliz pra sempre condensado naquele pedaço de vida.
Agora, preciso dar conta de conquistar outras coisas.
Nada me trará o feliz para sempre de novo.
Já foi.
E isso não é uma dor. É um alívio.
Um alívio imenso da construção cultural.
Ser feliz pra sempre? Ok, já fui, e agora.
Dar conta de mim é bem mais complexo que isso.

Há um mundo inteiro que independe do meu feliz pra sempre.
Se eu gostaria que tivesse durado mais?
Talvez, mas o pra sempre não tem medida.
É irreal, impessoal e passageiro.
O que importa é que o feliz pra sempre que existiu
foi o melhor que poderia ter existido.
"Eles foram felizes para sempre."
E depois foram atrás de outras coisas.

domingo, 12 de janeiro de 2020

Quando você decidiu ir embora...

...muita coisa mudou.
Nicolas ficou sem pai. Arnaldo sem seu companheiro de passeio.
Dvds passaram a juntar poeira em cima da estante, pois não foram mais assistidos.
Os cafés da manhã nunca mais foram tão caprichados pra ninguém.
A roupa de cama permanece a mesma. As toalhas são as mesmas. Panos de prato também.


As roupas ficaram quarando na sacada.
Os filmes de super-heróis foram sendo lançados, mas não foram assistidos.
Nem músicas pop tocaram mais na tv.
Nenhuma pizza chegou na encomenda, nenhum carnaval foi novamente comentado, nenhum show foi reprisado, nenhuma aula foi preparada.
Não houve mais banho de madrugada. Ou conversas sob a janela salpicada de gotas de chuva.
Ninguém tira soneca a tarde.

As fotos do casamento se dissolveram todas. Não há mais registros de nenhuma coreografia.
O vídeo se dissolveu na nota final do violino tocando uma de suas músicas preferidas.
Uma Lu não se lembrará. A outra não conseguirá esquecer.
Ninguém aqui escreve com letra tão bonita.
A Academia nunca mais foi vista.

N'algum lugar talvez tudo isso ainda aconteça. Na sua nova praça, na sua nova rotina. Nos seus novos ninhos.
Aqui, tudo mudou.
Pois o que era repleto de risadas, as alterações pelos dramas da vida,
os Natais que eram cerimoniosos,
os aniversário que eram desastrosos,
os sonhos que eram vivos
os medos que eram todos
até mesmo as juras feitas...
Tudo sumiu.
Para dar espaço à um grande e silencioso vazio.