sexta-feira, 18 de abril de 2014

O ponto de equilíbrio

Já temos as mesmas risadas
os mesmos bordões
reclamações semelhantes

Mas não consigo entender o porquê
de não querer
juntar

seu rosto com o meu
meu ombro e sua cabeça
seu abraço ao meu
meu riso e o seu silêncio
sua revolta e a minha paciência
minha explosão e a sua cumplicidade
sua ciranda e meu rock'n'roll
meus super-heróis e sua natureza
minha doença e sua cura
sua âncora e minhas asas
meus sonhos e sua realidade
a sua e a minha necessidade de espaço
minha palavra engolida e sua palavra no olhar


o ponto de equilíbrio
algo a nos acrescentar
arriscar pra poder ter
além do que já temos
eu tenho uma noite fria que se tornou quente
você tem o quê?

quinta-feira, 10 de abril de 2014

O porquê de eu ter vindo pra esse mundo

Eu não vim pra esse mundo pra querer tão pouco.
Eu não vim pra esse mundo pra não fazer o que eu quero.
Eu vim pra me entregar por inteiro,
Mergulhar até os pulmões doerem,
Me doar por completo, do primeiro fio de cabelo até o dedinho do pé,
E me doer todo por qualquer sentimento que não cabe em mim.

Eu não vim pra esse mundo pra ouvir gente me dizendo o que fazer

Me dizendo o que vestir
Ou como tenho que ser.
Principalmente, não vim pra esse mundo pra perder tempo com esse tipo de coisa.
Eu vim pra beber, pra dançar, pra curtir,
Pra beijar e ser beijado,
Pra tocar e ser tocado,
Pra amar e ser amado.

Eu não vim pra esse mundo para entendê-lo.
Nem para tentar explicá-lo.
Prefiro trocar com você as experiências que formam esse monstro que você vê quando olha pra mim.
Ou esse príncipe que te diz: "Eu vou com você".
Eu vim pra morder a mão do universo e vê-lo sangrar diante dos meus olhos.
Pra chorar. Pra resmungar.
Pra deitar sobre você. Sob você. Pra me fundir com a flora.
Vim pra explodir.

Eu não vim pra esse mundo pra ser pequeno, passar despercebido.
Eu vim pra marcar. Pra ferir a história sangrenta e cheia de injustiças.
Eu vim pra deixar algo que provoque uma mudança e assim me esticar até o fim dos tempos.
Eu vim pra cantar. Eu vim pra fazer da arte meu instrumento de comunicação, já que as palavras não servem mais.
Eu vim pra lutar.
Eu vim pra arrebentar.

Portanto, peço que não me diga o que fazer.
Não se baseie em livros de contos de fada pra justificar seu preconceito, sua raiva, sua negação de si mesmo.
Eu prometo que tentarei ser o melhor que posso ser.
O melhor ser humano que posso ser.
E te espero pra um jantar, com vinho, pizza, gargalhada, troca de números, linguagem corporal afiada.
Eu espero e torço pra que você seja como você é. É uma luta diária.
É uma luta minha também.
Mas, vem cá,
não é bem melhor assim?

domingo, 6 de abril de 2014

A face de deus

4:00AM.

Foi quando ele viu a face de deus pela primeira vez na vida. Tudo resplandeceu debaixo da lua, a fumaça subindo em espirais delirantes na pouca área que ocupavam os corpos ansiosos por prazer, compromisso e satisfação carnal. A divindade não lhe dirigiu atenção, nem mesmo quando uma cascata de cereja jorrou da boca do rapaz e pairou no ar. Apenas sorriu. Engaiolou uma das cerejas dentro de sua própria boca e ficou sorrindo, os olhos perspicazes tentando compreender o momento único que se desdobrava naquela fenda de universo.
O rapaz trajava vestes elegantes e, sem perder a compostura, quis se impor. Com sua espada avermelhada, foi à luta. O primeiro golpe acertou em cheio o peito de deus que se abriu em tradições hispânicas e histórias pela metade sobre alguma viagem. Como num clichê de filme, o momento slow motion enfatizou a inevitabilidade da troca de fluídos e códigos corporais que não significam muito no segundo seguinte. Aquilo foi algo inacreditável. Lançados os dados, o jogo começara no Olimpo.

4:30AM

Ainda em contemplação, o rapaz, nas fichas finais, apostou tudo. Pensou ter perdido por um momento, mas virou a mesa na curva final e comemorou com um beijo enérgico que deixou uma tatuagem em forma de crucifixo na boca dos dois. E assim, colado a deus, fervilhou como um enxame irascível de abelhas. Agora e para sempre, queria mais.

5:00AM

Persuadiu a conhecê-lo melhor. Moveu-se voluptuosamente de um lado para o outro tentando evocar algum contorno semelhante em deus. Por fim, ainda apertados num nó constituído de fios de álcool, compraram passagens para visitar O Deleite. Partiram soltos e esquecidos pelo mundo, dispersos em suas próprias conclusões sobre aquele encontro. Se o mundo parou por um segundo qualquer, passou despercebido. O tempo corria muito depressa, antecipando o final dilacerador que incinera os deixados por deus. Até mesmo quando se encontraram debaixo das cobertas, não havia vestígios de futuras visitas. E não se vê deus duas vezes.

6:00AM

Tolamente comprimido em sentimentos e febril, o rapaz abandonou-se deitado como uma estrela. O riso transformava-se em escárnio agora que dependia apenas de si mesmo para tocar a vida. Surrupiou da memória um último relâmpago do sorriso perfeito da face de deus. Foi então que se deu conta. Ele viu a face de deus pela primeira vez na vida. Mal lembrava seu nome. Mas tocou seu rosto, seus lábios. Engatinhou para um turbulento sono juvenil e carente de sentidos. Abraçou aquele resquício de presença divina. Nem todos tem essa sorte.

8:00AM

Dormiu pouco. Não era sonho.
Acordou sorrindo.