segunda-feira, 31 de março de 2014

Você sabe quem você é?

Entornei a vida num único gole aditivado com vodca. E desde então o ar inspirado não sai.
O cansaço domina cada músculo enquanto me petrifico deitado embaixo da janela onde poderíamos ter feito amor. Cada joule gasto num movimento é um sacrifício terrível. Preservo meu direito de não morrer, como já concluí muito tempo atrás, exceto se eu quiser, e quando eu quiser.
Mas me deparo com a possibilidade inatural de desaparecer completamente.
E se meu pensamento simplesmente ficasse mais vago a cada segundo doloroso enquanto não sinto frio nem calor? E se, então, eu tivesse intervalos imprecisos de pensamento nulo... Para depois me atracar num abraço apertado com o vazio, meu criador.
Os intervalos de silêncio são absolutos e compreendem toda a arquitetura da criação do universo.
Eu sumo porque não somo.
Diante da iminência da não-existência, acendo um cigarro para dar um tom cinematográfico ao ambiente. Não vou morrer, caso os vizinhos se preocupem, mesmo sem serem capaz de interromper o sexo escandaloso as 4h da manhã, eu deveria estar dormindo, pois trabalho mal e porcamente amanhã, e por que deveriam?, ou mesmo a mensagem seja transmitida errada para o remetente errado.
Primeiro sinal. Deixo de fazer sentido e simplesmente canto enquanto trago e engulo as notas porque o som nada mais é do que uma onda que me afoga e me rebate e me degola e me encobre.
Esse gole de vida que tomei não caiu bem.
Talvez eu coma uma pizza enquanto meus pensamentos falham e eu caminho cambaleante para o final da vida pensante.
Não me suporto mais. Não suporto esses pensamentos dia após dia. É tão frustrante calcular qualquer possibilidade. Frustrante fazer o levantamento dos fatos (e danos) até aqui. Não consigo mais nem pensar em trivialidades. Os dias passaram a se resumir em um nome e um sobrenome.
Antigamente, eu daria graças por vestir esse amor ornamentado de sonhos brilhantes. Isso me dava a sensação de ter um objetivo. De esperar um momento, de ter saudade gostosa de algo, de não esperar reciprocidade.
Hoje em dia, enquanto o sol não nasce, o tormento não alivia. Nunca passa. Mas quando o sol nasce, ele alivia. Nunca passa. Mas, SE o sol nascer, talvez alivie. Não tá passando. Somente se o sol nascer eu posso ver melhor o que há entre eu e o desejo.
Depois de me esfaquear todo e me sujar de vísceras e entranhas, então, eu posso chorar. Morrendo de pena de mim mesmo. Pouco tempo pra dormir e sem mais vodca pra misturar com a vida (outra coisa pra eu pensar depois).
Debaixo dessa janela poderíamos ter feito amor. Poderíamos ter feito futuro. Poderíamos ter tido tudo.
E eu desapareço no meio da fumaça. Não morro. Apenas deixo de existir (juro que não ficará nada sujo, nenhum sinal do meu crime de desistência {posso pegar cadeia por isso?}). E nem sequer concluo este texto já que ninguém se interessará em saber que

terça-feira, 18 de março de 2014

Alguém [17]

Alguém que estava no ônibus e te roubou um beijo.
Alguém que é delírio proibido e condenável, injustificável, terrivelmente avassalador.
Alguém que era passageiro e foi passageiro em todos os sentidos possíveis.

Alguém que você nunca mais viu.

Não vejo a hora

Não vejo a hora
de ir embora
de ser casebre abandonado e frio
de estar distante no meio do mar
salgado de mágoa e delirante da falta de ar
de colecionar moedas
de recortar poemas
fazer mural com as pistas do meu paradeiro.
Talvez alguém me puxe
me siga
me ouça
Me encontre.

Eu não vejo a hora de voltar no tempo.
E viver tudo de novo.

Não vejo a hora de me somar ao vento
e ser viagem para todo lugar

Quando eu chego em casa, tudo é silêncio.
Como se pisasse em cascas de ovo. E elas doem como braseiro.
E eu me pego aproveitando a angústia.
A dor que me fascina e me faz sentir vivo. Porque eu não vejo a hora de brotar no copinho plástico e me alastrar pela multidão que grita firme e forte que quer revolução.
Não vejo a hora de mudarmos.